25/10/12

Cores, números e letras - formas de identificação nos Transportes Colectivos

Quem anda nas ruas do Porto (e não só), e utiliza os serviços da STCP; sabe que os seus autocarros têm a cor azul e branca, assim como as suas linhas são identificadas por três algarismos ou por letras - se bem que quem utilize os serviços da  rede Madrugada saiba que números e letras convivem na numeração das linhas.
Mas nem sempre foi assim. Tempos houve em que as cores dos eléctricos, autocarros e tróleis eram diferentes, assim como a forma de se identificar as linhas / carreiras. Existem muitas pessoas que se recordarão bem como foi.

Hoje, proponho uma pequena viagem no tempo, naquilo que são as cores, números e letras dos Transportes Colectivos do Porto.

  As cores
Nos anos 40, altura em que foi então fundado o Serviço de Transportes Colectivos do Porto, o esquema de cores nos carros eléctricos baseava-se no castanho-claro (igual ao que os actuais carros eléctricos utilizam). Foi aliás, com este esquema de cores que os primeiros autocarros da empresa entraram ao serviço - assim como os últimos eléctricos a serem construídos na cidade do Porto (os Pipis e o eléctrico 500).
Este esquema foi-se mantendo durante algum tempo, até á entrada em serviço dos primeiros tróleis. E aqui começou a haver uma distinção clara de cores: os eléctricos mantiveram-se castanhos; enquanto que os autocarros passaram a ter a cor verde; e os tróleis estrearam-se com a cor vermelha.

Foto de JHM0284

Foto de Ernst Kers

 Foto de Peter Haseldine, retirada de VASCONCELOS et al (2010)

Foi um esquema que vigorou durante toda a década de sessenta do século XX e parte da década de setenta. Todavia, os autocarros Volvo que foram adquiridos em 1973 já vinham com uma cor diferente: o laranja. E este esquema foi-se impondo, a pouco e pouco, aos restantes veículos da frota. O laranja facilitava a visibilidade dos veículos, sobretudo à noite.

Todavia, os eléctricos constituem uma excepção. Continuavam a manter a cor original, até porque eles eram vistos como um elemento a substituir. Com efeito, as linhas de eléctrico iam sendo substituídas por linhas de tróleis e, sobretudo, por linhas de autocarros. Daí que, tirando a publicidade, nenhum eléctrico teria direito a esquemas de pintura renovados. Era uma realidade que se manteria durante toda a década de oitenta, em o laranja era praticamente a cor oficial do Serviço.

Foto de Tim Boric, retirado do site de Ernst Kers.

 Foto de Tony Walmsley


Porém, no inicio da década de noventa, mudar-se-ia outra vez o esquema de pintura dos veículos - com a entrada dos primeiros autocarros Mercedes - Benz - em que o laranja partilharia a primazia com o branco. Mas desta vez, a renovação seria reservada apenas aos autocarros - pois os troleicarros teriam um fim anunciado em breve.

Foto de autor desconhecido. Fonte desconhecida, retirada de pesquisa de imagens no Google.

Autocarro 1014, próximo do Hospital S. João - verão de 2006.

E em 1998, com a entrada em serviço de mais 90 autocarros (os actuais 1700), assistiu-se a uma nova mudança de esquema de cores em que todos os autocarros foram, gradualmente, passando as suas cores para o azul-e-branco - exactamente aquele que hoje está em vigor para toda a frota. Tal se deve ao facto de, através de um inquérito, a população ter manifestado essa vontade. O azul-e-branco eram as cores de uma instituição que melhor personificava a cidade: o Futebol Clube do Porto.

 Autocarro 1110 na Rua de Sá da Bandeira, desde sempre com este esquema de cores.

Autocarro da série 1700. Foram os autocarros desta série que estrearam este esquema de cores.

Os eléctricos, vendo cada vez mais os seus percursos a diminuir quer em número, quer em extensão, mantiveram com as cores inalteradas. Hoje, até por uma questão de tradição e de diferenciação face á frota de autocarros, continuam a manter o mesmo esquema de sempre. Todavia, isso não impediu com que os eléctricos se apresentassem com um ar renovado, face aos trabalhos de restauro a que foram sujeitos. 

 Eléctrico 205, um dos eléctricos que se mantém ao serviço da empresa e que foram alvo de renovação.

 Números e letras
Em 1946, com a fundação então do Serviço de Transportes Colectivos do Porto, as linhas de eléctrico eram identificadas por números. Era um esquema que vigorava ainda no tempo da sua antecessora a Companhia de Carris de Ferro do Porto (CCFP). Note-se, a titulo de curiosidade, que o sistema de números nas linhas de eléctrico vigorava desde 1912.

Por norma, um número significava uma linha. Mas se o número tinha um ou mais traços (/) ou terminava em E, era sinal que o seu percurso teria uma variante - normalmente um encurtamento ou um término diferente. Para se ter uma ideia, deixo aqui um exemplo:

10 - Bolhão - Bonfim - São Roque - Venda Nova
10/ - Bolhão - Bonfim - São Roque - Santa Eulália - São Pedro da Cova
10// - Bolhão - Bonfim - São Roque - Santa Eulália - Gondomar
10E - Praça da Liberdade - Bolhão- Bonfim - São Roque

Todavia, em 1948, aquando da entrada em serviço dos autocarros, a empresa decidiu (possivelmente para evitar confusões com o serviço dos eléctricos)  atribuir letras ás linhas de autocarro, que saiam todas das Avenida dos Aliados. A primeira linha a entrar ao serviço foi a linha C (Carvalhido), ao qual se juntaram depois as linhas D (Antas) e A (Foz). Mais tarde, em Outubro, foi a vez da linha B (Paranhos) entrar em funcionamento.


Quanto aos troleicarros, a sua missão inicial seria a de prestar um serviço que substituísse o dos carros eléctricos. Com efeito, detectou-se que a Ponte D. Luís I sofria de problemas estruturais causados pela rede de carros eléctricos. E assim, em 1959, os eléctricos começaram então a circular pelas ruas de Vila Nova de Gaia. Repare-se que numa primeira fase, a numeração dos tróleis também não coincidia com a dos eléctricos, muito embora também fosse constituída por algarismos. Optou-se então por numerar as linhas dos troleis com os números 31,32,33 e 36 - para assim, também não haver hipóteses de confusão com as linhas dos carros eléctricos.

Todavia, não deixa de ser curioso que na altura da substituição das linhas de carros eléctricos por tróleis (nas linhas de Gondomar e Ermesinde) se atribuísse a numeração igual ou próxima dos eléctricos que até então circulavam. Por exemplo, a linha 9 (Bolhão - Ermesinde)  dos eléctricos manteve o número quando passou para troleicarro. A linha 10 dos eléctricos (e as suas variantes) foram renumeradas como 10, 11 e 12, com destinos para a Venda Nova, S. Pedro da Cova e Gondomar, respectivamente.

Porém, em 1967, no que toca á rede de autocarros, as letras do alfabeto já estavam (quase) todas preenchidas. Todavia, surgiam mais e mais solicitações de novas carreiras. Como é que então o STCP ia resolver o problema? De uma forma relativamente simples. Todas as novas carreiras de autocarros teriam números, mas com o prefixo um (1) à frente - por exemplo, foram criadas as linhas 101 (Avenida dos Aliados - Lomba) ou 159 (Bolhão - Aldeia Nova). Os electricos e os tróleis mantinham o sistema de um/dois algarismos.

Em 1974, sopraram ventos de mudança. A partir de Abril, todas as novas linhas que se criavam seriam numeradas em sistema igual ao dos eléctricos e dos tróleis. E em Julho, a empresa decidiu unificar a numeração da sua rede: a partir dessa data desapareceriam as letras e os números com três algarismos na rede de autocarros, passando toda a rede da empresa a ser identificada de igual forma: com numeração a um/dois algarismos.

Noticia de "Jornal de Noticias", de 23 de Abril de 1974, que exemplifica a nova de numerar as linhas de autocarros a criar. 

 Avisto do STCP; indicando a alteração da identificação das linhas de autocarro já existente; publicado no jornal "O Comércio do Porto", em 15 de Julho de 1974.

Tirando algumas linhas especiais (como o serviço Aerobus, por exemplo) ou algumas linhas que funcionavam durante curtos períodos de tempo, durante 33 anos a numeração da empresa não sofreu qualquer tipo de alteração.

Todavia  em 2006, algumas linhas passaram a ser numeradas a três digitos - seria a preparação da "Nova Rede", que daria origem à rede de autocarros com a identificação actual. As únicas excepções são as linhas "locais", com identificação Z (ZR e ZM, por exemplo) ou as linhas da Madrugada, que combinam letras e números. No entanto, os eléctricos continuam a ter um sistema diferente, visto que têm numeração a um ou dois dígitos. 




Fontes:
- Blog de Cristopher Leach,
- Site de Ernst Kers;
- Site de Carlos Lima;
- Flickr de JHM0284;
- Flickr de Tony Walmsley;
- Flickr da STCP;
- Jornal o Comércio do Porto, Julho de 1974;
- PT/ADPRT/EMP/STCP > Recortes de Jornais de 1972 a 1974 > Arquivo Distrital do Porto

Bibliografia:
- VASCONCELOS, António et al: Troleicarros do Porto: Quatro Décadas na Cidade; Ordem dos Engenheiros - Região Norte, Porto, 2010;
- PACHECO, Helder: Porto, Cultura em Movimento; Edições Afrontamento; Porto; 2008;
- MONTERREY, Guido: O Porto, origem, evolução e transportes; edição de autor; Porto; 1972

3 comentários:

  1. Excelente artigo e trabalho de pesquisa. Continuação de um bom trabalho.

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  2. Olá Caro Pedro. Muito obrigado pelo seu feedback. Espero ser que este blog continue a merecer a sua visita.

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  3. Muito interessante e elucidativo. Obrigado por partilhar o seu trabalho de pesquisa.

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